O ano de 2017 se encaminha para um término no mínimo contraditório a se julgar pelas informações que circulam no mercado, a começar pelo imbróglio no qual se transformou a mãe de todas as reformas, aquela que, dizem autoridades do governo, poderia – pode? – colocar alguma disciplina nos gastos da administração pública do país: a reforma da Previdência Social.
A munição que o presidente Michel Miguel Temer tinha para usar com o objetivo de conseguir apoio para aprovar as tais reformas estruturantes, entre elas a da Previdência, teve boa parte de seu estoque consumida com a finalidade de garantir a permanência de Temer na cadeira presidencial.
Enquanto o presidente se esforçava para se manter no cargo, o texto da reforma previdenciária foi sendo detonado e pouco do que originalmente deveria ser o arcabouço da reforma se manteve. Para piorar a situação, o Congresso Nacional preferiu empurrar para 2018 a votação, e talvez, a aprovação da reforma da Previdência. Só que, o ano que vem também traz eleições, aí fica mais difícil mobilizar parlamentares para essa tarefa.
A novidade nesse tema foi a mudança no discurso do governo federal para justificar a necessidade de mudar, agora, os parâmetros que norteiam os benefícios previdenciários, com ênfase para a aposentadoria, focando os privilégios que funcionários e agentes públicos usufruem quando se aposentam, como a garantia de manter na inatividade os mesmos valores que ganhavam quando em atividade.
Para se ter uma ideia dos privilégios que o governo diz tentar combater com a reforma previdenciária, basta lembrar que o déficit do governo federal com um milhão de servidores federais aposentados, em 2015, atingiu R$ 90,7 bilhões. Já a massa de 33 milhões de aposentados oriundos da iniciativa privada gerou um déficit de R$ 85 bilhões.
Dados compilados pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Anbima), citado pelo jornal Valor Econômico, dão conta que, no Executivo federal, a despesa média por servidor é de R$ 7,58 mil, no Ministério Público da União chega a R$ 18,05 mil, enquanto militares obtêm 9,58 mil.
No Legislativo, o recordista nos gastos médios com benefícios, conforme a Anbima, é de R$ 28,55 mil, enquanto o Poder Judiciário atinge R$ 26,30 mil por servidor.
No setor privado, como se sabe, a média dos benefícios é pouco mais de R$ 1,2 mil. Enquanto o segurado do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) tem um teto de contribuição, cerca de R$ 5,53 mil, que é o maior valor, também, para receber como aposentadoria, não são poucos, na esfera pública, os que recebem mais do que o teto previsto em lei para os servidores públicos, algo como R$ 33 mil.
Mas é justamente nesse núcleo de privilegiados, onde a aposentadoria pode ser uma punição, que está a maior resistência à reforma da Previdência. Como é o caso dos magistrados que, se cometerem falta grave podem sofrer a “pena” da aposentadoria compulsória. Só para ilustrar como está arraigada a percepção de que os privilégios devem ser mantidos, basta citar o caso recente da desembargadora aposentada que se enquadrou como em regime de trabalho escravo por não ganhar a remuneração devida a um ministro, acumulada com sua a posentadoria de magistrada.
Enquanto isso, na senzala, digo, na iniciativa privada, aonde o trabalho realmente gera riqueza, quem consegue aposentadoria de três salários mínimos já se dá por feliz.